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CAPÍTULO 2 - Uma reunião atemporal coma garota dos meus sonhos

— Shijoin-san...

Uma onda de nostalgia tomou conta de mim e lembranças vívidas se agitaram atrás de meus olhos. Lembrei-me de seus cabelos longos e lustrosos, que brilhavam com uma elegância tranquila, e de seus olhos claros e profundos, como joias preciosas. Ela era realmente a personificação de Yamato Nadeshiko, com uma beleza calma e uma presença graciosa que parecia intocada pelo tempo. Seu sorriso aberto e gentil refletia a bondade que ela carregava em seu íntimo.

Ali estava ela, Shijoin Haruka. A garota que eu havia admirado discretamente durante todo o ensino médio.

— Há algum problema? Você parece muito surpreso...

Sua voz carregava o mesmo refinamento suave de que eu me lembrava, e cada movimento que ela fazia tinha uma graça tranquila. Ela era assim mesmo. A família Shijoin tinha uma reputação estimada, e seu pai era o presidente de uma grande multinacional literária. Em muitos aspectos, ela se sentia como uma princesa moderna.

— Ah, eu só estava me distraindo um pouco. Bom dia, Shijoin-san.

— Bom dia para você também! — respondeu ela com um sorriso alegre, quase adorável demais. 

Apesar de sua beleza e status, Shijoin-san nunca menosprezou ninguém.

Ela sempre foi gentil, mesmo com alguém como eu, que mal aparecia na hierarquia social da escola. Com um visual que chamava a atenção e uma figura que a maioria invejaria, não era difícil entender por que os outros garotos estavam tão encantados com ela.

Como pode alguém tão maravilhoso... enfrentar um futuro tão trágico...

O que antes era uma admiração inocente agora parecia muito mais pesado. Sua beleza, que costumava brilhar tão facilmente, me causava dor agora que eu sabia que tipo de destino a aguardava. Depois do ensino médio, Shijoin-san prosperou. Seu charme e brilho atraíam as pessoas para ela, mas também despertavam um ciúme silencioso e persistente, especialmente de algumas das mulheres ao seu redor.

Sua vida se tornou um ciclo constante de dificuldades. Coisas desapareciam, ela era culpada por erros que não havia cometido, boatos se espalhavam pelas suas costas e cada vez mais trabalho era imposto a ela. E isso foi apenas parte do que ela suportou.

Shijoin-san era gentil demais para imaginar que os outros pudessem ser tão cruéis, então ela se enterrou em seu trabalho, o que só piorou as coisas. Sua família não sabia, e sua saúde mental começou a desmoronar lentamente.

Na mesma época, os negócios de sua família enfrentaram sérios problemas financeiros e a família Shijoin estava à beira do colapso. Como ela manteve seu sofrimento escondido, sua família não percebeu o quanto ela estava carregando - até que fosse tarde demais. Sentindo-se completamente encurralada, Shijoin-san acabou tirando a própria vida. A morte de uma herdeira da empresa foi manchete, e seu trágico fim serviu como um duro lembrete de como a vida pode ser implacável. Fiquei sabendo da notícia durante um dos períodos mais sombrios de minha vida. Isso fez com que tudo parecesse ainda mais pesado.

Fiquei tão chocado na época... Não conseguia nem comer.

Eu não tinha falado muito com Shijoin-san em minha vida anterior. Mas na monotonia da minha juventude, aqueles poucos momentos com ela se destacaram como estrelas dispersas. Eram pequenos, mas me traziam alegria. Mesmo assim, as lembranças eram calorosas.

Sua beleza era inegável, mas o que realmente ficou comigo foi a bondade que ela demonstrava para com todos, até mesmo para alguém como eu, mesmo que apenas por um momento. O simples fato de saber que uma garota como ela existia e trazia um calor silencioso que eu não conseguia explicar. Mas o mesmo mundo corporativo cruel que me desgastou também drenou lentamente a luz dela. A pressão para se encaixar, para ser o que eles queriam, esmagou a pessoa brilhante e inabalável que ela costumava ser.

Essa reviravolta cruel do destino foi um lembrete doloroso de como o mundo pode ser implacável. Ela também me trouxe de volta a dor de minhas próprias perdas passadas. Mesmo depois de minha morte, não consegui esquecer o desespero e o desamparo que senti quando soube que ela havia partido.

Ela tinha um coração tão gentil... e ele já havia sido partido uma vez. Eu não conseguia suportar a ideia de que isso aconteceria novamente.

Se o destino pudesse ser reescrito, eu a salvaria, custasse o que custasse. Eu ainda não sabia como, mas depois de doze longos anos, tudo o que eu queria era chegar até ela.

****

— Ei, Shijoin-san. Você parece bem animada hoje de manhã.

— Hehe, fiquei acordada até tarde lendo de novo. Não se deixe enganar pela minha aparência, foi muito difícil sair da cama hoje. Mas valeu totalmente a pena. Olha o que eu trouxe. O volume sete de The Zero’s Errand Runner!

Ela riu enquanto tirava um romance leve de uma bolsa de algodão, provavelmente emprestada da biblioteca. Não pude deixar de sorrir. Lembrei-me de como ela se tornou uma verdadeira fã de romances leves, experimentando todos os tipos de gêneros, até mesmo histórias de ação e mistério.

— Ah! Esse volume é tão emocionante. Especialmente a parte em que Gennai enfrenta sozinho um exército de setenta mil soldados para proteger seu senhor.

— Exatamente. É tão bom encontrar outra pessoa que também ama a série.

Conversar com ela assim era fácil e acolhedor. Era o tipo de troca que eu sentia falta na minha vida anterior.

— Eh... Niihama-kun, você parece um pouco diferente hoje.

— Oh? Você acha?

— Sim, você costuma ser mais reservado e calado... mas é bom ver esse seu lado mais alegre hoje!

Ela era surpreendentemente observadora. Nós dois fazíamos parte do comitê da biblioteca, e a primeira vez que realmente conversamos foi quando a ajudei a encontrar um romance leve que ela estava procurando. Depois disso, ela começou a me cumprimentar com mais frequência, às vezes até compartilhando seus últimos favoritos comigo e me contando como eram interessantes.

Mas, naquela época, o meu antigo eu ficava nervoso e sem palavras perto da ídolo da escola. Eu só conseguia dizer um fraco e nervoso “Ah, hum, que bom...” e nossas conversas nunca iam a lugar nenhum.

Bem, eu também não era exatamente uma pessoa muito sociável quando adulto, mas a vida profissional me ensinou que eu não podia continuar usando isso como desculpa.

No trabalho, fosse conversando com uma mulher bonita, um cliente difícil ou um chefe que gostava de forçar os limites, eu não tinha escolha. Se eu ficasse calado, tudo o que recebia em troca era sarcasmo e desprezo. Eventualmente, tive que aprender a me comunicar.

— Ver você tão alegre e fácil de conversar me fez querer parar de murmurar. Estou tentando ser mais claro com minhas palavras agora.

A verdadeira razão pela qual eu corrigi minha voz baixa, porém, foi meu chefe obcecado por esportes, que não parava de me importunar sobre isso.

— Eu? Isso é... um pouco embaraçoso de ouvir.

Minhas palavras, que poderiam ter soado como bajulação, fizeram Shijoin-san corar e desviar o olhar timidamente.

Ela era tão gentil, tão alegre e quase infantilmente ingênua na maneira como falava.

Talvez por isso, mesmo que muitos rapazes tivessem uma queda por ela no ensino médio, ela nunca parecia notar e nunca acabava namorando ninguém, apesar de ser tão bonita.

— Oh, esses são os livros que você está devolvendo à biblioteca? Eles parecem pesados. Deixe-me ajudá-la a carregá-los.

— Oh, isso é muito gentil da sua parte, Niihama-kun. Ainda assim... acho que exagerei desta vez. Dez livros é muita coisa.

— Tudo bem, a escola fica bem ali.

Dizendo isso, rapidamente peguei a sacola da biblioteca cheia de livros das mãos dela.

Espere, o que estou fazendo? Minha boca e minhas mãos simplesmente se moveram sozinhas. Por que fiz isso? Droga, isso deve ser um hábito do trabalho.

No meu trabalho, havia muitas colegas mais velhas, e elas podiam ser difíceis de lidar. Sempre que carregavam algo pesado e viam um homem por perto, era como se esperassem que ele dissesse: “Deixe-me ajudá-la com isso”. Se você não o fizesse, elas ficavam ofendidas. Eu lidava com isso com tanta frequência que se tornou um reflexo automático.

— Ah, muito obrigada. Sinceramente, peguei muitas coisas emprestadas. Meus braços estavam começando a doer. Isso é uma grande ajuda.

Ótimo... Pelo menos não pareci um esquisito forçando minha ajuda.

As memórias tendem a suavizar com o tempo, mas a fofura da Shijoin-san, seu brilho e seu charme natural estavam tão vívidos quanto eu me lembrava. E agora, pela primeira vez, nossa conversa fluiu tão naturalmente que me deixou... honestamente feliz.

— Sabe, não é só a maneira como você fala... você parece diferente do Niihama-kun que eu vi ontem.

— S-sério? Você acha?

— Sim. É como se você tivesse encontrado sua voz. Há uma espécie de força na maneira como você se comporta agora, e eu acho isso maravilhoso.

— Espere, sério?

Só Shijoin-san poderia dizer algo assim com um sorriso tão gentil. O impacto foi irreal. Meu peito realmente doeu.

Se ela realmente me vê dessa forma... talvez aqueles doze anos não tenham sido completamente desperdiçados, afinal.

— Fico muito feliz em ouvir isso. Enfim, você pegou muitos livros, hein? Algum chamou sua atenção?

— Sim! Cada um deles era bastante atraente! Primeiro...

A caminhada até a escola com Shijoin-san foi tranquila da melhor maneira possível. Nossa conversa se tornou fácil e calorosa. Alguns dos outros alunos não pareciam muito entusiasmados em ver alguém como eu, um cara quieto e estudioso, conversando com alguém como ela. Mas decidi não deixar isso me afetar. Só de caminhar até a escola assim, algo que eu nunca poderia ter imaginado no passado, parecia um pequeno milagre.

****

Ah... esta é a minha sala de aula de antigamente...

Atravessar os portões da escola e trocar meus sapatos por chinelos no armário despertou algo em mim, uma onda silenciosa de nostalgia. Mas no momento em que entrei na sala de aula onde passei tantos dias, o sentimento ficou ainda mais forte. As fileiras familiares de mesas e cadeiras, o quadro-negro gasto, o zumbido fraco das conversas no ar... Sim, era assim que me sentia naquela época.

— Então, Niihama-kun, vamos dar o nosso melhor depois da escola também — disse Shijoin-san com um sorriso.

— C-certo.

Consegui responder, embora o significado ainda não tivesse sido totalmente registrado.

O que eu deveria fazer depois da escola? Oh, droga! O trabalho do comitê da biblioteca!

Essa era a única razão pela qual Shijoin-san e eu conversávamos. Nós dois fazíamos parte do comitê. E, aparentemente, hoje era o nosso turno juntos. Definitivamente preciso ir para lá... mas primeiro, concentre-se no aqui e agora.

Ok, onde está minha mesa...? Ah, lá. Cara, essas mesas e cadeiras com aparência de madeira trazem lembranças.

Para ser sincero, eu não tinha ideia de onde ficava meu lugar, mas, felizmente, vi minha velha bolsa de ginástica pendurada embaixo de uma mesa. Olhar dentro dela foi como desenterrar uma pequena cápsula do tempo. Livros e cadernos esquecidos, cheios de curiosidades antigas.

— Uau... meus cadernos antigos. Minha caligrafia é uma bagunça.

Perdido na nostalgia, mal ouvi o sinal da manhã. Mesmo depois de doze anos, meu corpo respondeu instintivamente ao “Levantem-se, façam uma reverência”. Alguns hábitos realmente permanecem.

Após os avisos da professora, uma garota com cabelo médio e óculos foi para a frente. Ela era bonita, mas sua expressão era vazia, tornando-a difícil de entender. Sinceramente, ela não me causou muita impressão na época, e ainda não causa.

Hum, qual era o nome dela? Ka... alguma coisa-hara?

— Olá a todos, sou Kazamihara e fui colocada no comitê do festival cultural. Se tiverem alguma ideia para o evento, por favor, me digam o mais rápido possível, pois o prazo final é na próxima semana. Só para vocês saberem, todos os anos recebemos algumas ideias ridículas, como ‘um café de biquíni para meninas’ ou ‘uma fogueira na sala de aula’. Todas elas serão descartadas.

Kazamihara, a garota de óculos, falou com uma voz totalmente monótona. Seu tom não mudou nem um pouco quando ela voltou para o seu lugar.

Um festival cultural, hein? Acho que é aquela época do ano de novo...

Pensando bem, o festival da nossa escola sempre era na primavera. Mas não me lembro muito bem dele, então é difícil ficar animado.

Bem, parece que ainda falta um tempo. Por enquanto, é mais importante me acostumar com a vida no ensino médio novamente. Tenho que lembrar como fazer todas essas coisas da escola...

Naquele primeiro dia da minha “nova vida”, ou segunda chance, ou o que quer que fosse, minha cabeça estava tão cheia que mal registrei o anúncio do festival cultural. Eu também tinha que me preocupar com a aula de matemática, o que não ajudava em nada.

— Ugh, cálculo. Já esqueci tudo.

****

— Niihama.

— Hã? Ginji? É você mesmo?

Durante o intervalo, o rapaz que se aproximou era Ginji Yamahira, meu único amigo do ensino médio. Ele era um otaku como eu, mas com seu cabelo curto e arrumado, parecia mais um atleta. Quando perguntei a ele sobre isso na época, ele disse: “Se você se veste como um otaku, está apenas procurando problemas. Essa é minha estratégia defensiva.”

Nós mantivemos contato após a formatura e até saímos para beber algumas vezes. Mas já fazia um tempo.

— Como assim, “é você mesmo”? Enfim, deixa isso pra lá... O que está acontecendo com você?

— Comigo?

— Não se faça de bobo! Estou falando da Shijoin-san. Por que você estava andando e conversando com ela hoje de manhã?

— Não foi nada demais... Eu só a encontrei no caminho, e ela estava com as mãos cheias de livros da biblioteca. Eu a ajudei a carregá-los até a sala de aula.

— Sério?! Você costumava ficar todo nervoso e não conseguia falar com garotas bonitas, lembra? Desde quando você começou a fazer coisas saídas diretamente de mangás shoujo?!

Honestamente, não foi planejado nem nada. Apenas uma memória muscular residual dos meus anos como funcionário corporativo. O eu do ensino médio definitivamente não teria feito isso.

— E por que você está... diferente? Você está falando tão claramente agora, e aquela aura estranha que você tinha desapareceu totalmente. Você foi transportado para outro mundo ou algo assim, e depois voltou depois de um período muito difícil?

Perto, mas foi um salto no tempo, não um isekai.

— Você acertou, Ginji. Acredite ou não, eu estava em outro mundo até ontem. Doze anos brutais em uma organização horrível de trabalho escravo. Madrugadas, noites tardias, insultos sem parar e ver todos ao seu redor quebrando. Não eram exatamente férias.

— Haha, isso é horrível! Parece um isekai sombrio mesmo!

Sim, é uma realidade sombria. Pode parecer uma piada para você, jovem e inocente, mas esse tipo de inferno existe mesmo neste mundo, Ginji. Ainda assim, faz tempo que não temos conversas bobas como essa. Parece que voltei.

— Bem, Shijoin-san é gentil e um pouco ingênua, então ela é legal até com caras como nós. Mas não se empolgue. Os craques do clube esportivo e todos os “normies” estão atrás dela. Você vai ser esmagado.

Então a palavra “normies” já existia naquela época. É meio deprimente, na verdade. Nós, otakus, estávamos no fundo da cadeia alimentar. Bastava se destacar um pouco para que os garotos legais percebessem. Era o suficiente para sermos alvos.

As pessoas sempre falavam sobre o sistema de castas da escola como se fosse uma piada. Mas não era. Olhando para trás agora, a ideia de crianças lutando por status social parece meio ridícula. Mas acho que esse tipo de coisa nunca acaba, não é? As pessoas ainda competem por nomes de universidades ou quanto dinheiro ganham...

— Vou tomar cuidado. Obrigado pelo aviso, Ginji.

Não importa quem tente me perseguir, não vou mais jogar pelo seguro. Viver com medo, sempre esperando o próximo golpe — foi isso que roubou minha adolescência e me transformou em um zangão corporativo.

Desta vez, vou viver como quero. Não vou me permitir ficar cheio de arrependimentos novamente.

****

E então... no mesmo dia em que tomei minha decisão, ele apareceu.

— Tch. Olha só esse perdedor. Niihama, o otaku. Ei, estou falando com você.

Era hora do almoço. Eu estava tirando minha carteira da máquina de venda automática quando ele me chamou com uma voz aguda. Lembrei-me daquele medo frio, da maneira como meu estômago costumava revirar toda vez que eu o via na escola. O medo dele agarrar meu colarinho e gritar comigo. Naquela época, ele era assustador — tanto que eu fazia desvios só para evitá-lo. Mas agora...

Ele não é nada assustador...

Enfrentando-o agora, com aqueles piercings chamativos, todo aquele medo antigo parecia ridículo. Todo o seu comportamento rebelde, exibindo piercings no ensino médio, parecia infantil.

Honestamente, é até engraçado.

— Encontrei você na hora certa. Ei, que tal emprestar um dinheiro para o seu amigo almoçar hoje, Niihama? Eu, hum, esqueci minha carteira.

Ele me deu aquele mesmo sorriso sarcástico, como se estivesse me menosprezando. Acho que eu costumava ser um alvo fácil. Mas não sou mais.

— Hã? De jeito nenhum! Por que eu te daria dinheiro?

Esse cara é... Hino? 

O nome me veio à mente imediatamente. Um cara mal vestido, com brincos, sempre perseguindo os alunos mais fracos. Ele dizia coisas como: “Ei, me dê um pouco da sua mesada. Somos amigos, certo?” e se você hesitasse, ele ameaçava: “Você acha que pode me dizer não?”

Hino realmente pareceu surpreso com a minha franqueza.

— Não mexa comigo... Você acha que está em posição de responder assim? Continue falando e eu vou te espancar até você ficar em pedaços!

— Cale a boca. Como se eu fosse entrar na sua onda de durão.

— Como é? Você realmente quer me irritar tanto assim, hein?

— É uma encenação, não é? Você é apenas um delinquente de mentira. Você parece ser, mas não tem coragem de se meter em encrencas de verdade. Você nunca bateu em ninguém.

Pensando bem, eu nunca tinha ouvido nenhuma história sobre Hino se envolvendo em uma briga de verdade ou em problemas sérios. Ele nem mesmo resistia aos professores. Quando você analisa com calma, ele não era um delinquente de verdade.

— Você provavelmente só pede pequenas quantias para não causar confusão. Apenas o suficiente para explorar alvos fáceis sem chamar atenção. Não importa o quanto você aja como durão, um cara insignificante como você não me assusta mais.

— N-Não acredito...! Vou te matar, seu merda! Agindo todo importante agora, mesmo sendo apenas um otaku patético, Niihama! Você não tem ideia do que está por vir!

Como eu imaginava, o rosto de Hino ficou vermelho de raiva. Eu tinha acertado em cheio.

Ele gritou uma ameaça com sua voz alta de sempre, mas eu não era mais ingênuo o suficiente para me abalar com isso. Depois de tudo o que meus chefes me fizeram passar no mundo corporativo, isso não era nada.

— Essa tarefa é de sua responsabilidade. Se você decidir não lidar com ela, sua avaliação de desempenho refletirá isso. Espero que você entenda.

— Vá em frente e tente me enfrentar. A partir de amanhã, você será designado para separar suprimentos no depósito do porão, e essa tarefa não mudará, não importa quanto tempo passe.

— Negue o assédio moral o quanto quiser. Se chegar a esse ponto, posso facilmente providenciar para que outros testemunhem que você foi o culpado.

Só de lembrar desses momentos, senti um arrepio na espinha. No pequeno mundo das empresas exploradoras, aqueles que detinham o poder tinham controle absoluto. Tive que engolir meu orgulho e conter as lágrimas mais vezes do que posso contar.

Em comparação com isso, esse cara não tinha nenhum poder real sobre mim. Ele é apenas um garoto. Não importa o quanto ele gritasse, eu não sentia nem um pingo de medo.

— Então, o que você vai fazer? Se vai me bater, bata logo. O que há de errado? Não consegue fazer isso agora que as pessoas estão olhando? Você está apenas fingindo ser durão porque tem medo de ser suspenso ou expulso?

— Seu... maldito otaku! Não me subestime!

Hino se lançou em minha direção. Eu esperava um soco e, sinceramente, isso teria simplificado as coisas. Mas, em vez disso, ele arrancou da minha mão a carteira que eu estava segurando para comprar uma bebida. Dentro dela estavam os 3.000 ienes que minha mãe me dera.

— Hah! Como punição pela sua boca atrevida, vou ficar com isso hoje. Vamos ver... Hã? Só 3.000 ienes? Como esperado de um otaku perdedor tão patético.

“Só 3.000 ienes”? Ele age como uma criança, jogando insultos assim por aí...

— Mas não pense que isso acabou. Da próxima vez, vou garantir que você aprenda uma lição de verdade.

Ele se virou para sair, ainda falando com arrogância, mas eu já tinha dado um passo à frente e o agarrado pelo colarinho com as duas mãos.

— O que?

— Cale a boca.

Enquanto eu o encarava, cheio de desprezo, ele congelou. Seus olhos se arregalaram em choque.

— Você estava tentando roubar meu dinheiro?

As palavras saíram mais frias do que eu esperava. Mal reconheci minha própria voz.

— Você mesmo disse. Apenas 3.000 ienes. E você achou que isso lhe dava o direito de pegá-lo?

— E daí? E se eu pegasse?

— Não brinque comigo! — eu disse, minha voz se elevando acima do silêncio repentino que tomou conta da multidão ao nosso redor.

— Que absurdo é esse de “só 3.000 ienes”? Você tem ideia do quanto é difícil ganhar essa quantia?

Eu estava absolutamente furioso. Hino claramente nunca tinha ganhado dinheiro. Ele não tinha noção do valor do dinheiro e também não tinha gratidão por ele. Não consegui conter minha raiva por esse pirralho mimado que tentava pegar o dinheiro que minha mãe tinha trabalhado tanto para ganhar.

— Eu destruí meus pulsos por excesso de trabalho, digitando até mal conseguir mover os dedos. Eu abaixava a cabeça para clientes que gritavam comigo por coisas que eu não podia controlar. Um erro e eu era chamado de idiota, de inútil, mandado para o inferno.

— Você tem noção do quanto as pessoas precisam trabalhar duro para ganhar dinheiro? Não é só o trabalho. É lidar com pessoas que te tratam como lixo, ficar calado quando tudo dentro de você quer gritar e simplesmente se arrastar para poder continuar. E você acha que pode simplesmente roubar o resultado de tudo isso?

A intensidade na minha voz deve ter surtido efeito. Hino parecia genuinamente abalado, toda aquela arrogância de antes tinha desaparecido completamente. Eu já tinha lidado com abusos de poder no trabalho, onde chefes abusavam da sua posição e saíam impunes. Mas ver esse mesmo tipo de arrogância aqui, cara a cara, onde o respeito deveria ser natural, teve um impacto diferente.

Não se tratava apenas dos 3.000 ienes. Tratava-se do que aquele dinheiro representava — o trabalho, a exaustão, o orgulho engolido apenas para ganhá-lo. Tratava-se da ideia de que as pessoas deveriam tratar umas às outras como seres humanos, não pisar nelas como se não fosse nada.

— Escute. Dinheiro não é apenas papel. Você o ganha depois de passar por um inferno, não é algo com que se brinque. Um garoto como você, que nunca lidou com nada real, agindo como um aspirante a gangster e roubando das pessoas, merece ser repreendido.

— É isso que é dinheiro. É o que você ganha depois de levar golpe após golpe e ainda assim se levantar.

— Você age como se fosse durão, mas foi mimado a vida toda. Você tem refeições quentes, banhos quentes e uma cama para dormir todas as noites. Tente roubar o dinheiro que meus pais ganharam com tanto esforço de novo e eu vou te machucar pra valer. Entendeu?

— Ah... uh...

— Eu disse, entendeu?

— Sim, eu... entendi...

Talvez fosse a maneira como ele menosprezou o significado daquele dinheiro. De qualquer forma, ele gaguejou uma resposta, claramente abalado. Soltei o colarinho dele. Ele caiu no chão e eu peguei minha carteira antes de ir embora. Eu podia sentir todos ao redor me observando.

Mesmo que tudo tivesse acabado, eu não conseguia parar de pensar. Aquele dinheiro não era apenas dinheiro. Era esforço. Era sacrifício. Era algo que você não deixa alguém levar sem lutar.



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AKEMI FTL

UMA TRADUÇÃO DE FÃ PARA FÃ

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