INTERLÚDIO 2 - A escolha de Kazemiya Kohaku
- AKEMI FTL
- 20 de ago.
- 7 min de leitura
— Até mais, Kazemiya.
— Até mais, Narumi.
Éramos apenas nós dois em uma festa da turma com apenas dois participantes.
Mais uma vez, Narumi me acompanhou até em casa após sairmos do Flowers. Passei pela entrada, quase assustadoramente limpa e luxuosa, e entrei no elevador. A caixa metálica subiu a torre envolta em elegância, levando-me ao último andar, onde ficava minha casa.
Destrancando a porta, entrei no apartamento escuro como breu. Uma escuridão fria estava no centro do exterior opulento. Meu pai, minha mãe e minha irmã provavelmente estavam todos no trabalho. Honestamente, era raro que todos estivessem em casa. Essa casa escura e vazia era o que significava “normal” para mim.
Larguei minha bolsa e caí na cama, ainda com meu uniforme. Ele provavelmente ficaria amassado, mas não me importei. Afinal, havia coisas mais urgentes em minha mente.
— Haa...
Com uma longa expiração, finalmente deixei sair o algo indescritível que estava se formando em meu peito.
— ...
Meu coração estava acelerado. Meu corpo estava quente, especialmente meu rosto. Parecia que o calor de um quarto em pleno verão, com as janelas fechadas e o ar-condicionado desligado, havia se instalado em todo o meu corpo. Eu não entendia e nem tinha ideia do porquê de estar me sentindo assim.
— Por que ele teve que vir...
O rosto do garoto que me acompanhou até em casa mais cedo, aquele que provavelmente estava voltando para sua casa sozinho agora, apareceu em meus pensamentos.
Ele deveria ter dado prioridade à sua família. Em vez disso, ele veio me ver, desconsiderando suas próprias obrigações familiares.
Ele deve ter corrido para cá com todas as suas forças. Seu cabelo estava bagunçado, seu rosto coberto de suor e seu uniforme desalinhado.
O quanto ele correu desesperadamente para chegar até lá?
— Ele é um idiota. Um completo idiota. Ele não se mete na vida das pessoas, mas depois aparece, parecendo tão determinado, correndo e... Que idiota!
Narumi é um idiota. Um grande idiota sem noção que não consegue nem mesmo definir suas prioridades.
Priorizar um amigo em vez de sua família? Isso é ridículo. Ele é um idiota. Um idiota. Um idiota. Narumi, o idiota.
— Mas... eu estava feliz.
Não era para eu pensar assim. Eu sabia que não deveria me sentir assim, por isso me esforcei tanto para mascarar isso chamando-o de idiota.
— Eu estava feliz porque o Narumi veio me ver. Fiquei feliz porque achei que não o veria mais. Fiquei feliz em sentar e conversar com ele.
Quando comecei a admitir isso, as palavras continuaram a sair, como se uma represa tivesse se rompido.
— Fiquei feliz por ele ter vindo quando eu estava sofrendo... Feliz por ele ter vindo quando eu estava à beira das lágrimas...
Eu não conseguia parar. A alegria continuava a jorrar de dentro de mim.
— Fiquei feliz por ele ter me escolhido.
Ontem, tive a infelicidade de encontrar minha mãe na entrada do apartamento. Eu já havia contado O Narumi sobre meu relacionamento ruim com minha família. Eu havia desabafado com ele sem parar.
Essa é a última coisa que eu queria que Narumi visse.
Foi o que pensei quando nos separamos. Eu não queria que ele visse isso. Não queria que O Narumi, mais do que ninguém, visse isso. Não sabia por que, mas a ideia me deixou enjoado a ponto de chorar.
Eu era inferior à minha irmã. Para minha mãe, eu era apenas o garoto que arrastava todos para baixo.
Eu não era necessário para minha família. Eu não queria que Narumi visse esse meu lado. Eu estava apavorada e aterrorizada com a possibilidade de Narumi parar de olhar para mim, de passar tempo comigo, de me deixar para trás. Só a ideia era suficiente para me paralisar.
Mesmo na escola hoje, eu só conseguia pensar nisso. A ideia de que eu não veria Narumi depois da escola diminuiu ainda mais meu ânimo. Isso não podia ser evitado. Narumi tinha sua família. Mesmo que as coisas não fossem perfeitas, família ainda era família. É por isso que não podia ser evitado.
A sexta-feira passaria, o fim de semana chegaria e passaria, e na segunda-feira eu o veria novamente.
Será que eu o veria?
Depois de me ver daquele jeito, depois de ver o tipo de criança que eu era, será que o Narumi ainda iria querer ficar comigo? Será que aqueles momentos reconfortantes depois da escola se tornariam apenas um sonho passageiro?
Será que eles se transformariam em uma ilusão cruel que escaparia do meu alcance?
Essa ideia me assustava. O dia na escola se arrastou. Por um momento, pensei em não ir ao Flowers hoje, mas meus pés se moveram por conta própria e, antes que eu percebesse, estava sentado em nosso lugar habitual.
— Free Refil para dois.
Foi só depois de fazer o pedido que me dei conta: Narumi não viria hoje. Eu não precisava pedir para dois.
— Eu sou tão idiota.
O Narumi não estava aqui. O tempo passou lentamente.
Provavelmente ele está em casa agora… Passando tempo com sua família…
Talvez ele estivesse finalmente confortável em casa e tivesse decidido não vir mais aqui. Era só nisso que eu conseguia pensar quando...
— ?
Uma notificação apareceu no meu celular e era do Narumi.
— Hã?
Eu nem precisei abrir o aplicativo.
A mensagem foi totalmente exibida no banner de notificação.
KOUTA: Estou indo para aí.
O texto era simples. Simples, no entanto, transmitia tudo.
Que ele sabia que eu estava sentada em nosso lugar de sempre, no restaurante de sempre, hoje.
Que ele estava deixando sua família para trás para vir até mim. Que ele queria que eu ficasse lá e esperasse por ele. Isso me disse tudo.
Será que isso é um sonho? Minha mente está me mostrando algo conveniente demais, perfeito demais para ser real?
Duvidei de mim mesmo, mas imediatamente rejeitei o pensamento.
— Ele realmente veio.
Narumi… Narumi Kouta estava se aproximando rapidamente, um pouco sem fôlego.
— Hoje não era para ser o dia em que você ficaria em casa?
— Esse era o plano.
Narumi se sentou na cadeira à minha frente, a que havia se tornado “seu assento habitual” nos últimos cinco dias.
— Hoje, decidi que vou ouvir suas reclamações.
Ei, Narumi…
— Você decidiu ouvir minhas reclamações? Espera, o quê? Por quê?
.

— Porque… Coisas da escola, coisas pessoais e coisas da família. Compartilhar e ouvir um ao outro. Esse é o tipo de aliança que fizemos, não é?
Narumi veio me ver. Neste momento, neste exato momento, você tem ideia de como isso me deixou feliz?
— ...
— Diga alguma coisa.
— Desculpe. Eu não sei... Eu só... Eu não sei.
— Você não sabe?
Eu estava muito feliz. O fato de Narumi ter vindo me ver, só isso já me deixava muito feliz.
Tão feliz que não conseguia expressar isso em palavras. Não importa quantas palavras eu usasse, não importa o quanto eu tentasse descrevê-la, acho que nunca conseguiria expressá-la completamente.
— Eu só... não esperava que você viesse. Achei que não o veria hoje… e agora que você está aqui, não sei nem como processar isso. Acho que estou apenas... confusa.
Eu realmente estava confuso, mas, mais do que isso, eu fiquei muito feliz. Estava fazendo o possível para não chorar. Estava segurando o choro com tudo o que tinha.
— Deus... meu rosto está queimando.
Por quê!? Por que só de lembrar que o Narumi veio me ver… não… Por que só de pensar no Narumi meu rosto fica tão quente?!
Meu coração está batendo cada vez mais rápido desde então.
Eu não entendo nada disso. Por que estou me sentindo assim? Alguém, por favor. Alguém que me diga o que esse calor avassalador dentro de mim realmente significa.
Ao mesmo tempo, porém, parte de mim não quer saber. Porque se eu entendesse, algo poderia mudar… algo grande.
Isso provavelmente é apenas outra forma de fuga. No mínimo, posso admitir que estou tentando fugir de algo desconhecido.
Está tudo bem. Eu vou ficar bem. Só preciso tomar meu tempo, para me acomodar pouco a pouco.
Por sorte, amanhã é sábado. Não precisarei ver o Narumi. Então, até lá, de alguma forma, encontrarei uma maneira de me refrescar desse calor. O verdadeiro problema vem depois disso.
— Que tipo de cara eu devo fazer quando ver o Narumi de novo?
Essa era a única coisa que estava me preocupando agora. Fazia muito tempo que eu não me preocupava com algo não relacionado à minha família.
Eu não conseguia expressar isso em palavras. Não importava quantas palavras eu juntasse, não importava o quanto eu tentasse expressar, eu sabia que não conseguiria transmitir a profundidade dos meus sentimentos.
— Acho que... eu só não esperava que você viesse. Achei que não nos veríamos mais hoje. E agora... não sei, estou tão confusa...
Era verdade, eu estava confusa, mas, mais do que isso, eu estava feliz. Eu estava fazendo o possível para conter as lágrimas.
— Isso é ruim. Meu rosto está muito quente.
Por que isso acontece? Só de pensar em quando o Narumi veio me ver... não, só de pensar no Narumi... faz meu rosto esquentar. Meus batimentos cardíacos ficam cada vez mais rápidos.
Não sei, não sei. Não sei de nada. Por que estou me sentindo assim?
Gostaria que alguém pudesse me dizer o que significa esse calor dentro de mim.
Mas, ao mesmo tempo, não quero saber.
Porque se eu descobrisse, sinto que algo mudaria. Algo grande.
Isso provavelmente é apenas outra maneira de fugir. Eu pelo menos entendo isso que estou fugindo do que quer que seja.
Está tudo bem. Vou me acalmar com o tempo. Só preciso de tempo.
Por sorte, amanhã é sábado. Não verei o Narumi.
Então, até lá, encontrarei uma maneira de controlar o calor.
O verdadeiro problema vem depois disso. O que acontecerá em seguida.
— Como vou encarar o Narumi agora?
Essa era a única coisa que pesava em minha mente.
Fazia tanto tempo que eu não me preocupava com nada que não fosse relacionado à minha família.
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