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CAPÍTULO 6 - O “algum dia” que Kazemiya Kohaku esperava

Depois de completar todos os turnos originalmente programados, nosso trabalho de verão chegou ao fim. O dono da loja nos agradeceu calorosamente e até acrescentou um pequeno bônus ao nosso salário antes de sairmos da cabana à beira-mar.

— Natsuki, você teve algo a ver com isso?

— Não. Pelo que ouvi, as vendas deles foram melhores do que o normal este ano graças à cobertura da mídia. Além disso, acho que Kazemiya-san teve um papel importante nisso.

— Eu?

— Houve bastante agitação em torno da linda garota que trabalhava aqui. Ela atraiu muitos clientes.

Pensando bem, havia muitos clientes que estavam claramente aqui apenas para ver Kazemiya. Não que isso importasse para ela, pois ela manteve sua postura fria característica, efetivamente afastando a maioria deles. Ainda assim, o charme de Kazemiya era inegável.

Eu sabia que seria natural que os homens se sentissem atraídos por ela, mas... 

— Narumi? Você tá me assustando.

— Kazemiya-san, é assim que um namorado ciumento se parece.

— É mesmo?

— Sim. É exatamente assim. — respondi sem hesitar e minha adorável namorada corou, rapidamente desviando o olhar, envergonhada.

Na noite em que nos tornamos um casal, contei a Natsuki sobre nosso novo relacionamento. Não foi só porque eu estava feliz, eu devia muito a Natsuki. Se não fosse por ele, talvez eu nunca tivesse sido capaz de enfrentar meus sentimentos. Ele merecia ser o primeiro a saber, como meu amigo de infância e confidente mais próximo. 

— Às vezes, sinto que Inumaki te conhece melhor do que eu — murmurou Kazemiya. 

— Bem, eu o conheço desde sempre. Mas não se preocupe, não pretendo perder para você tão cedo.

— Eu vou superar você eventualmente.

— Acha que consegue?

— Fica só vendo.

Os dois trocaram farpas enquanto eu ficava entre eles, sem saber como reagir.

Eu deveria dizer “Não briguem por minha causa”? Isso também não parece certo.

— Natsuki, obrigado por tudo — eu disse. 

— Só de ouvir isso já faz minha vida valer a pena. — ele respondeu com um sorriso radiante antes de se dirigir para a catraca. 

— Até mais, Kazemiya-san. E Kouta... da próxima vez, vamos sair para algum lugar divertido em vez de trabalhar.

— Muito obrigado por toda a sua ajuda. Ah, e Kuon-san também agradece.

— Vamos planejar algo. Da próxima vez, eu pago.

— Estou ansioso! Até mais.

Acenamos até que a figura de Natsuki desaparecesse na estação, depois nos viramos para a van estacionada nas proximidades.

— Já se despediu do seu amigo? — perguntou Kuon, esperando por nós no banco de trás.

— Sim. Tudo certo.

— Eu também passei seus agradecimentos.

— Ótimo. Ouvi dizer que Kohaku-chan deu muito trabalho para ele, então queria agradecer diretamente, mas... bem, eu vagando por aqui provavelmente causaria uma cena.

Ela diz isso depois de aparecer sem avisar no restaurante antes?

— Encontrar Kohaku-chan e garantir que ela estivesse bem era uma emergência. Quem se importa com aparências durante uma crise?

A observação de Kuon parecia quase como se ela tivesse lido minha mente, o que, honestamente, não me surpreenderia neste momento. 

— Ei, hã... não que eu seja ingrato, mas seu trabalho vai ficar bem? Tipo, vir até aqui por nossa causa… 

— Tudo bem! Minha agenda sempre prioriza o tempo com Kohaku!

— Não foi isso que eu quis dizer...

— Eu planejei esse tipo de situação há muito tempo. Além disso, hoje foi um dia relativamente livre.

Não perguntei que tipo de “planejamento” isso envolvia. Uma única palavra, chantagem, passou rapidamente pela minha mente, mas eu a ignorei. 

— Tudo bem, vamos lá! — Kuon chamou o motorista e a van começou a se mover. 

Além do motorista, éramos apenas nós três: Kuon, Kazemiya e eu. 

Destino… 

— Você está realmente pronta para voltar para casa, Kohaku-chan? — perguntou Kuon gentilmente.

— Sim, eu vou voltar. E desculpe por tudo, Nee-chan. Por te preocupar e por te envolver nisso.

— Não se desculpe. Sinceramente, foi um prazer para mim. Mas voltar para casa significa enfrentá-la, você sabe.

— Eu sei. É por isso que decidi voltar.

O olhar de Kazemiya era firme, sua determinação transparecendo claramente. Kuon-san pareceu satisfeita com isso e acenou com a cabeça, como se dissesse “Entendo”. 

— Mas foi mesmo certo me ligar? Você poderia simplesmente ter voltado para casa com Narumi-kun.

Depois de decidir voltar para casa, Kazemiya entrou em contato com Kuon-san e pediu que ela nos buscasse. É claro que poderíamos ter pegado o trem de volta, como fizemos quando Kazemiya fugiu pela primeira vez. Dessa forma, poderíamos ter prolongado essa fuga um pouco mais, mas decidimos não fazer isso. 

— Conversei com Kazemiya e decidimos. É hora de parar de prolongar isso.

Nossa fuga terminou no momento em que chegamos àquele oceano escuro naquela noite. Aquele era o beco sem saída para a “Aliança dos Restaurantes Familiares”.

Nós podíamos ficar lá ou voltar. Essas eram nossas únicas opções e escolhemos voltar. Ir para casa. Enfrentar a mãe dela. A partir do momento em que Kazemiya resolveu fazer isso, aceitar o fim era inevitável. 

— Além disso, eu queria ouvir de você sobre ela.

— Entendo. Você evoluiu muito, não é? Dizem que “um menino cresce após três dias de separação”, mas no caso da Kohaku-chan, é mais como “um anjo cresce após dois segundos de separação”.

— Isso não é verdade.

— Até Confúcio ficaria impressionado.

— Nee-san, por favor, seja séria. Eu imploro.

Com uma expressão melancólica como aquela, qualquer um gostaria de responder a ela. Na verdade, a reação de Kazemiya foi bastante louvável. 

— Não se preocupe, eu vou falar. Eu vou falar, mas... não estou exatamente ansiosa para fazer isso.

— Por que não?

— Porque isso só vai magoar Kohaku-chan.

Do nosso lugar, não podíamos ver o rosto de Kuon. Eu não tinha ideia de que tipo de expressão ela tinha, que tipo de emoções ela guardava por dentro. 

— Tudo bem. Mesmo assim...

— Tem certeza? Você pode acabar dizendo que não quer ir para casa, afinal.

— Não vou.

— E qual é o seu motivo?

— Porque tenho meu namorado.

Kazemiya disse isso com confiança inabalável. 

— Talvez eu não consiga lidar com isso sozinha. Talvez isso só me machuque. Mas agora, não importa o quanto doa, tenho alguém que vai me apoiar... Narumi está ao meu lado. Então, tudo bem.

Nós apertamos as mãos, nossos dedos entrelaçados. Uma promessa silenciosa de não desistir. De apoiar uma à outra, não importa o que aconteça. 

— Ha ha... Entendo. Você tem um namorado, então está tudo bem. Faz sentido. Sim. Do jeito que você está agora, Kohaku-chan, com alguém ao seu lado, você ficará bem.

— Então, por favor, me conte. Sobre a mãe.

— Tudo bem… 

Aceitando a força de Kazemiya, Kuon começou a falar. 

— O que posso te contar é sobre a culpa dela.

— A culpa dela?

— Sim. Nossa mãe... carrega uma culpa em relação a você.

A mãe de Kazemiya. O peso que ela carrega. Os pais de Kazemiya aparentemente se divorciaram logo após ela nascer. O motivo não é conhecido. A mãe de Kazemiya nunca falou sobre isso, mas o fato é que a mãe de Kazemiya se tornou uma mãe solteira criando dois filhos. Voltar para a casa dos pais não era uma opção para ela. Depois de sair abruptamente de casa, ela nunca mais voltou.

Essa é a mãe de Kazemiya. 

— Então...

— Sim. Foi basicamente como fugir de casa.

A mãe de Kazemiya, que fugiu de casa, criou duas filhas sozinha. As dificuldades de trabalhar enquanto cria filhos sem ninguém com quem contar são algo que nem conseguimos imaginar. 

A certa altura, parece que ela chegou ao seu limite. 

— Foi por volta da época em que Kohaku-chan tinha cerca de dois anos. Você provavelmente não se lembra, mas... foi como se algo tivesse se quebrado dentro dela.

Naquela época, quando Kazemiya tinha apenas cerca de dois anos, ela teve uma birra e chorou alto.

— Ela bateu em você, Kohaku-chan. Não foi com o punho, apenas com a mão aberta. Mas você bateu a cabeça com bastante força e acabou sangrando muito.

— Entendo. Mas eu não me lembro.

— Foi um caos naquela época... Até sua mãe empalideceu, entrando em pânico enquanto chamava uma ambulância. Bem, se você não se lembra, é melhor assim.

Felizmente, apesar da cena, o ferimento em si foi leve e não deixou cicatriz. 

— É esse o fardo que ela carrega por Kazemiya?

— Isso mesmo. Mesmo que Kohaku-chan não se lembre, sua mãe se lembra. Ela sempre se lembrará. Ela nunca esquecerá.

— Entendo.

Eu conseguia entender por que Kuon hesitou em nos contar. 

Kazemiya estava tentando seguir em frente à sua maneira. Mas, para sua mãe, isso não importava. Não importava o quanto Kazemiya seguisse em frente, sua própria existência ainda poderia ser um fardo para sua mãe e não havia nada que pudéssemos fazer a respeito. 

— Nee-chan, você é muito madura, não é?

— Por que você diz isso?

— Eu sabia... Você nunca poderia abandonar completamente a mãe, certo? Você sabia como era difícil para ela criar dois filhos sozinha.

— Sim, ela ainda é nossa mãe, afinal. Mesmo que ela tenha te magoado muito por causa disso, Kohaku-chan.

— Tudo bem. E... Nee-chan, obrigada por me contar.

— Não, eu é que devo pedir desculpas por ter escondido isso de você.

A atmosfera dentro do carro ficou pesada, como um cobertor molhado sufocando o ar. Quebrando o silêncio, Kuon falou. 

— Chega de falar sobre a mãe. Agora, temos outra coisa para conversar, não é?

Ela virou a cabeça deliberadamente, principalmente na minha direção. 

— Como você planeja namorar minha preciosa Kohaku-chan?

— Sim, imaginei que isso fosse acontecer.

Agora que pensei nisso, lembrei-me de ter visto um comentário nas redes sociais dizendo que o sorriso de Kuon era “especialmente encantador”. 

Na época, não dei muita importância, era apenas mais um comentário que eu passei por alto. Mas agora, senti vontade de corrigi-lo. Não era “encantador”. Era mais como um espetáculo de terror assustador.

Será que o pescoço humano consegue virar assim? 

— Nee-chan, pare com isso. Deixe-nos em paz. O que importa como Narumi e eu namoramos?

— Importa sim!

— Você estava torcendo por nós quando apareceu no nosso trabalho.

— Isso foi antes de vocês começarem a namorar! Agora que estão juntos, é uma história completamente diferente! Como sua irmã mais velha, tenho o dever de meter o nariz nos seus assuntos!

— Por favor, pare. Você vai fazer Narumi achar que você é irritante.

— Meus sentimentos não importam nada para você?!

— Realmente não importam.

— Você... não se importa? Você está falando sério?

Kuon-san parecia genuinamente de coração partido com a resposta fria de sua amada irmã. Eu realmente queria que ela parasse de me olhar assim. Tinha a sensação de que ela me amaldiçoaria de verdade se quisesse. 

— Ugh... tudo bem... Ah, entendo como é... Vocês dois são tão apaixonados, devem ter feito um progresso sério até agora...

— ...

Progresso. A palavra imediatamente trouxe de volta memórias do que aconteceu depois que eu me confessei. 

Nós nos abraçamos na praia naquela noite... e nos beijamos. 

Kazemiya deve ter se lembrado disso também, porque ela apertou minha mão um pouco mais forte.

— Vocês provavelmente estão de mãos dadas agora... E talvez estarão se beijando em breve... Ah, só de imaginar isso meu cérebro entra em colapso...

— Hã?

— Hã?

Kazemiya, sentada ao meu lado, soltou um grito de surpresa e Kuon-san imediatamente percebeu. 

— Oh... hm, sim, é verdade...

Kazemiya tentou disfarçar, mas estava claramente se lembrando daquela noite na praia. Seu rosto ficou um pouco vermelho, e a expressão de Kuon ficou completamente vazia. 

— Até onde vocês realmente foram?

— Eu realmente preciso te contar?

— Vocês se beijaram cem vezes, não foi!? É essa a cara que Kohaku-chan está fazendo agora!!!

— Nós não nos beijamos cem vezes! Nós nos beijamos algumas vezes depois que nos confessamos...

— A... ahh...

— Não me lembro do número exato, mas... acabei pedindo muitos deles... Mas definitivamente não foram cem vezes!

— Grr... Gyaaaah!!!!!

— Talvez, no máximo, tenham sido apenas dois dígitos...

— Gyaaaaaahhhhhh!!!!!

Oh, ela está quebrada. 

A tentativa desesperada de Kazemiya de se explicar levou Kuon a soltar um grito semelhante ao de um inseto enquanto se contorcia em angústia. 

Então, é isso que acontece quando seu cérebro quebra... Os humanos são realmente incríveis. 

— Hm... Desculpe por fazer tanto barulho.

— Tudo bem. Estou acostumado com as travessuras de Kuon-san quando se trata de sua irmã.

O motorista parecia acostumado com esse tipo de situação. Não pude deixar de sentir um pouco de pena dele. 

— Não, não, não, não, não, não, não, não!!! De jeito nenhum!!! Não estou pronta para isso! Como irmã mais velha, não posso aprovar isso! Não! Nada! Absolutamente nada!

— Nee-chan.

— Não estou ouvindo, não estou ouvindo, recuso-me a ouvir qualquer coisa disso! Estou cancelando o retorno para casa agora mesmo!

— Você está sendo irritante.

Com um suspiro, Kazemiya desferiu seu golpe final e sua irmã ficou completamente em silêncio. 

☆  

Como era hora do almoço, decidimos comer algo antes de irmos para a casa de Kazemiya. Paramos em um restaurante familiar chamado “Flowers”. Kuon-san, no entanto, ainda não havia se recuperado mentalmente e, considerando o risco de outra explosão, decidimos que seria melhor nos separarmos por enquanto. 

O motorista, que acabou sendo alguém da agência de Kuon-san, ficou com ela. Aparentemente, havia também salas de jantar privadas nas proximidades, então eles decidiram comer lá. Honestamente, acho que o motorista estava apenas sendo atencioso conosco.

— Desculpe pela minha irmã.

— Não, de jeito nenhum. Na verdade, fiquei muito feliz em ver você e Kuon-san tendo aquele tipo de conversa.

— Por quê? Não foi irritante para você ser arrastado para tudo isso?

— Parecia que eu estava vendo duas irmãs muito próximas. Foi legal.

Kazemiya havia sofrido por causa da presença da irmã, ansiando pelo conceito de família, mesmo sendo atormentada por ele, mas agora, lá estava ela, interagindo casualmente com Kuon-san como uma irmã comum faria. 

Ver a pessoa que eu mais amo no mundo vivendo uma cena que ela sempre quis e lutou tanto para alcançar me deixa feliz além do que consigo explicar. 

— Obrigada.

Kazemiya, sentada ao meu lado, inclinou-se contra mim como se estivesse se rendendo completamente. Normalmente, estaríamos sentados um em frente ao outro com uma mesa entre nós, mas agora estávamos sentados lado a lado. 

Esse peso gentil em meu ombro me fez perceber a diferença em nosso relacionamento. Não se tratava de alianças ou amigos, era a proximidade de sermos namorados. 

— É graças a você, Narumi. Eu pude brincar com minha irmã assim e finalmente enfrentar minha mãe.

— Eu não fiz nada. Você enfrentou Kuon-san sozinha.

— É por isso que é graças a você, Narumi. Porque você me mimou tanto, porque me deu força. Você me aceitou, me abraçou, fugiu comigo quando eu precisei.

— Mas essa foi a sua força, Kazemiya.

— Não, foi tudo por sua causa, Narumi.

Percebendo que estávamos discutindo sobre algo bobo, nós dois soltamos uma risada. 

— Tudo bem, vamos dizer que foi graças a nós dois.

— Sim, vamos ficar com isso.

A voz de Kazemiya era doce e tão vulnerável que quase me deixou nervoso. Eu queria manter essa voz, esse calor, só para mim. Eu queria tapar os ouvidos de todas as pessoas do mundo para que só eu pudesse ter essa voz doce e confiante. 

Ainda assim, por enquanto...

— Você está bem? — perguntei.

— Com o quê?

— Com sua mãe.

O fardo que Kuon-san nos contou, aquele que a mãe de Kazemiya carregava. Pensar em como Kazemiya poderia se sentir sobre isso fez meus próprios desejos egoístas desaparecerem em segundo plano. 

— O que devo fazer? — ela murmurou, ainda encostada em mim. 

— Decidi enfrentar minha mãe, assim como enfrentei Nee-chan. Pensei em parar de fugir e voltar para casa. Mas... só por estar lá, faço minha mãe sofrer. O que devo fazer a respeito disso?

— Kuon-san parecia estar lutando com a mesma coisa.

Para Kazemiya Kohaku, a presença de Kuon era uma fonte de dor e sofrimento. 

É por isso que Kuon-san escolheu se distanciar. 

Ela saiu de casa para evitar causar mais dor a Kazemiya. 

— É... acho que, para a mãe, eu sou como Nee-chan era para mim. Mas é diferente. Pelo menos eu... mesmo que às vezes fosse doloroso, eu ainda amava minha irmã.

Por um momento, houve uma pausa, como se ela estivesse tentando conter algo.

— Minha mãe não me ama.

— Não acho que isso seja verdade.

Neguei as palavras de Kazemiya instantaneamente. Não queria que ela pensasse assim. Não queria que ela acreditasse nisso. 

— Se ela realmente te odiasse, não se sentiria sobrecarregada. Acho que ela te ama, Kazemiya.

— Por que você acha isso?

— Você mesma disse, não foi? Deve ter sido muito difícil para ela criar dois filhos sozinha. Fazer algo tão difícil... Não acho que ela teria conseguido sem amor.

Eu não tinha nenhuma prova concreta, nenhuma evidência sólida, mas tinha certeza disso. A mãe de Kazemiya devia amar a filha.  Talvez fosse apenas um desejo meu.

Mas mesmo assim... mesmo assim... 

— Obrigada, Narumi. Me sinto... um pouco melhor agora.

Mesmo assim, eu queria que esse desejo fosse real e acredito que seja.

Depois disso, nossa comida chegou e almoçamos, reunindo a energia necessária para voltar para casa. Era estranho reunir energia para voltar para casa, mas, para nós, era essa a determinação necessária. Especialmente para Kazemiya. 

— Este é o quinto carimbo — disse Kazemiya, segurando o cartão de carimbos. 

— Sim. O último.

Conseguir o quinto carimbo bem quando nossa fuga estava chegando ao fim, parecia um final perfeito. 

— Pensando bem, ainda não decidimos o que trocar pelos carimbos.

— Não, ainda não decidimos. Mas você disse que só o fato de colecioná-los comigo já era recompensa suficiente, então achei que não precisávamos decidir.

— Ei, não venha com essa. Eu disse para você esquecer isso.

— Eu disse que me lembraria disso mesmo no túmulo.

Ah, nostálgico. Tivemos essa conversa logo no início da nossa fuga. É claro que eu me lembro. 

— Não se preocupe. Vamos compartilhar um túmulo.

— O-o que... você... quer dizer?

— Acho que você sabe exatamente o que quero dizer.

Ah, minha namorada é tão fofa. 

Seu rosto estava vermelho brilhante e ela estava extremamente nervosa. Eu me senti um pouco mal pela Kuon-san, mas, honestamente, eu queria mantê-la só para mim. 

— De qualquer forma! Vamos decidir o que vamos ganhar como prêmio!

Ela mudou de assunto da maneira mais óbvia possível, mas mesmo isso era adorável e eu não pude deixar de sorrir para mim mesmo enquanto me inclinava para verificar a tela com Kazemiya. 

— Há muito por onde escolher. Pastas transparentes, lancheiras, sacolas… 

— Seria bom comprar algo que pudéssemos usar juntos. Mas só há uma lancheira ou uma sacola... Ah, as pastas transparentes vêm em um conjunto de cinco.

— Vamos ver se há mais alguma coisa que venha em um conjunto como esse.

Não que eu me importasse com as pastas transparentes, mas como era uma lembrança das nossas memórias de verão, eu esperava algo um pouco mais especial. 

— Que tal isso? — ela sugeriu. 

— Um conjunto de duas alças, hein?

Kazemiya apontou para uma alça em forma de flor. 

— Ah, parece que podemos escolher as cores também.

— É, você está certa. Tem branco e... vermelho.

Trocaram olhares, sorrindo. Sem precisar dizer uma palavra, tomaram a decisão. 

Depois de fazer a compra, mostraram os cinco carimbos completos ao vendedor da loja e escolheram as alças vermelha e branca como recompensa. 

— Você quer a branca, certo, Kazemiya?

Fora da loja, entreguei a Kazemiya a tira branca que acabávamos de comprar.

— Obrigada.

Vê-la segurar a tira branca com tanta delicadeza fez meu coração se encher de calor. Os obstáculos que Kazemiya logo enfrentaria eram assustadores, e não havia muito que eu pudesse fazer. Isso era frustrante além das palavras e me causava dor.

— Narumi. Tenho um favor a pedir. Tudo bem? — Kazemiya perguntou. 

— Claro.

— Ainda nem disse o que é.

— Se for um favor seu, Kazemiya, eu faço.

— E se for algo estranho?

— Estranho? Como o quê?

— Hum... bem... tipo, um beijo ou algo assim?

— Pff.

— Por que você está rindo?

— Só achei fofo.

— Você está tirando sarro de mim?

— Muito pelo contrário. É um elogio.

— De jeito nenhum.

Ela deve ter tentado desesperadamente pensar em algo estranho para pedir e o resultado foi simplesmente adorável. 

Além disso, se ela tivesse me pedido um beijo, não haveria motivo para eu recusar. Ela nem parecia perceber isso e isso a tornava ainda mais fofa, tão encantadora que eu não conseguia resistir. 

— Então, sobre esse favor. O que você precisa? — perguntei. 

— Quando eu for ver a mãe, você viria comigo?

O pedido de Kazemiya foi um pouco surpreendente. 

— Achei que você fosse sozinha.

— Esse era o plano. Mas... depois de ouvir o que Nee-chan disse sobre a mãe, percebi que provavelmente não conseguiria lidar com isso sozinha.

Ela continuou, com a cabeça baixa e os braços cruzados em volta do corpo. 

— Você disse antes, Narumi, que talvez a mãe me ame. Eu também espero que sim. Mas... não é apenas amor ou afeto. Acho que também há muitos sentimentos dolorosos e difíceis misturados. Enfrentar a mãe significa enfrentar tudo isso e... a ideia de fazer isso sozinha me assusta.

Os braços cruzados em volta do corpo pareciam estar lá para impedir que ela tremesse. 

— É diferente de quando enfrentei a Nee-chan. Nee-chan... havia muito amor no que ela sentia por mim, mas com a mãe é diferente. Mais do que amor ou carinho, são os sentimentos dolorosos e o ressentimento que pesam mais. Eu tenho medo de enfrentar isso sozinha. Desculpe. É patético, né? Eu finjo ser tão corajosa, mas agora estou tremendo... Na verdade, eu estou apenas...

— Você é incrível.

As palavras saíram naturalmente. Assim como meus braços ao redor dela.

— Você é incrível, Kazemiya. Absolutamente incrível.

No mínimo, eu ainda continuava fugindo dos meus problemas. Kazemiya era diferente. Mesmo com medo, ela estava pronta para enfrentar aquilo de que vinha fugindo todo esse tempo. 

Isso é incrível. Tem que ser. Então, por favor, deixe meus sentimentos chegarem até você. Através de palavras, através do toque e apenas deixe-os chegar até você. 

— Estarei ao seu lado. Vou te apoiar. Para que você possa encarar sua mãe sem medo. Apenas vá em frente.

— Mas e se eu quiser fugir de novo?

— Vou te abraçar assim e te impedir.

Engraçado, realmente. Eu era quem estava fugindo com Kazemiya e agora aqui estava eu prometendo impedi-la se ela tentasse fugir. 

— Eu disse à Nee-chan, não disse? Que talvez eu não conseguisse lidar com tudo sozinha. Que talvez eu acabasse me machucando. Mas agora tenho alguém que vai me apoiar, não importa o quanto eu me machuque. Você, Narumi.

— Você mesma disse.

— Você não estava errado. Enquanto Narumi-kun estiver comigo, posso enfrentar qualquer coisa.

— É o mesmo para mim.

Enquanto tiver Kazemiya Kohaku na minha vida, tenho certeza de que posso enfrentar qualquer coisa. 

Depois que terminamos o almoço, a paisagem fora da van gradualmente se tornou familiar, até que finalmente chegamos ao nosso destino. 

Um lugar familiar. Um lar familiar. A casa de Kazemiya. 

— Bem, acho que é aqui que vou deixar você. Boa sorte, Kohaku-chan.

— Você não vem com a gente, Onee-chan?

— Agora estou totalmente do seu lado, Kohaku-chan. Além de que você tem o Narumi-kun com você, certo? Três contra um seria um pouco injusto. Sabe, eu não me importaria, mas esse não é o tipo de abordagem que você gostaria, não é?

— Sim, você está certa. Eu quero falar com a mãe pessoalmente... se eu conseguir.

Kazemiya apertou minha mão enquanto dizia isso.

— Quero dizer o que está no meu coração... mesmo que ela não entenda.

— Entendi. Boa sorte, Kohaku-chan.

— Obrigada, Onee-chan. Vou dar o meu melhor.

Sentimos o calor de nossas mãos entrelaçadas e, juntas, demos nosso primeiro passo adiante. 

☆ 

Desculpe, Narumi. Eu... fugi de casa. 

 Naquele dia, eu fugi e agora, estou trilhando o mesmo caminho que fiz para fugir, mas na direção oposta. 

“Tudo bem mesmo, mãe?”

“Contanto que você não incomode Kuon, não me importo.”

“Estou falando sério. Estou realmente indo embora.”

“Se você acha que pode ir embora, vá em frente. Você vai voltar chorando em breve, de qualquer maneira.”

 Olhando para trás, eu era apenas uma criança egoísta buscando atenção. 

Só de lembrar disso, sinto vergonha. Que patética. 

Honestamente, eu quero fugir agora mesmo. Mas há alguém que aceita até mesmo essa parte patética de mim, alguém que eu nem consigo aceitar e, por causa disso, encontrei coragem para escolher este caminho. 

Para voltar para a casa de onde fugi tantas vezes com a pessoa mais importante do mundo ao meu lado. 

— Se alguma coisa acontecer, é só dizer.

— Como o quê?

— Como quando você sentir vontade de chorar nos braços do seu namorado.

— É, claro, idiota.

Provavelmente vou sentir vontade de chorar. Aqui mesmo, nestes braços. 

— ...

Respirei fundo, expirei, me acalmei e abri a porta com a chave. 

Afinal, eu voltei para a casa de onde fugi. 

— ...

Caminhamos juntos pelo corredor mal iluminado, com o único som sendo nossos passos.  Meu coração batia mais forte a cada passo. A luz da sala estava acesa. Parei por um momento, então abri a porta e entrei. 

— Cheguei.

O som que vinha da sala era o barulho de teclas sendo digitadas. Ignorando tudo ao seu redor, a pessoa que olhava para a tela do tablet era minha mãe. 

— Mãe. Estou de volta.

— ...

Ela não respondeu. Nem mesmo desviou o olhar da tela. Não disse mais nada.

Esperei pacientemente, minha mão ainda segurando firmemente a de Narumi. O ar condicionado da sala havia resfriado meu corpo do calor externo, mas nossas mãos ainda estavam quentes. 

— Então era isso que Kuon queria dizer quando me pediu para ficar em casa.

Ela deve ter percebido que eu não iria ceder. 

Minha mãe falou, com voz fria, ainda olhando para a tela. O som mecânico de sua digitação não havia parado. Ela nem mesmo olhou para o meu rosto. 

— E? Por que você voltou? Você já não tinha saído desta casa?

— Desculpe.

— Como eu imaginava, você voltou chorando. Exatamente como eu disse. Você se divertiu com esse joguinho infantil de fugir, então fique em casa daqui em diante. Você é um incômodo.

— Não estou me desculpando por ter fugido.

— Ah, é mesmo? Então que desculpa você tem desta vez?

— Eu... guardava rancor de você, mãe.

As mãos que digitavam no teclado pararam. 

— Sempre guardei rancor de você, mãe. Eu culpava você por tudo que dava errado na minha vida. Eu culpava você pela minha falta de talento, mas... não era culpa sua. Era porque eu era fraca. Eu não conseguia aceitar minha própria fraqueza, então sempre culpava outra pessoa. Nunca sequer considerei o quanto deve ter sido difícil para você nos criar...

Minha mãe não disse nada. Ela nem sequer olhou nos meus olhos.

Mas tudo bem… 

Tudo o que eu podia fazer era pedir desculpas. 

— Trabalhar meio período, ganhar um salário... tive um pequeno vislumbre de como é difícil ganhar dinheiro suficiente para sustentar uma família e criar filhos. E tudo isso graças à pessoa que está ao meu lado agora, Narumi. Eu tinha Narumi ao meu lado, e ele me apoiou. Mas você não tinha ninguém com quem contar, não é? Você estava sozinha, sem ninguém a quem recorrer... e mesmo assim nos criou. E, apesar disso, eu sempre te culpei.

Se Narumi não estivesse lá para mim, não tivesse me apoiado, eu teria voltado para casa chorando imediatamente e teria culpado você por tudo mais uma vez. Mas como não fiz isso, sei que tenho muita sorte e sou abençoada. 

— É por isso que... me desculpe. Me desculpe por guardar rancor de você sem saber de nada. De agora em diante, vou enfrentar minha própria fraqueza. Vou encarar você também. Mesmo que seja difícil, quero lutar de verdade com você.

— Cale a boca.

Uma raiva fraca e latente encheu o ar. 

— Não diga coisas que você não sente. Você ouviu da Kuon sobre mim, não foi? Sobre como eu levantei a mão contra você... Você ainda deve guardar rancor de mim. Você ainda deve me odiar. Você deve achar que sou imperdoável e ainda assim, um pedido de desculpas? Que falta de sinceridade...

— Você está certa. Eu guardava rancor de você. Eu estava magoada. Mas... não guardo mais tanto rancor quanto antes.

— Eu disse para você parar de mentir!

O som de seu punho batendo na mesa ecoou. Meu corpo ficou tenso e eu lutei para encontrar palavras. 

Narumi apertou minha mão levemente, como se quisesse parar o tremor que percorria meu corpo. Por causa disso, meu tremor parou. Eu consegui falar. Eu ainda conseguia me manter firme. 

— Não estou dizendo que não guardo ressentimento algum por você. Mas o sentimento de gratidão supera o ressentimento. O desejo de pedir desculpas é muito mais forte agora. É assim que realmente me sinto.

— Mentirosa. Mentirosa, mentirosa, mentirosa, mentirosa, mentirosa, mentirosa!!! Claro que é mentira!

Ela não acreditou em mim. Ela nem mesmo olhou para mim. Ainda assim... ainda assim... 

— Por favor, acredite em mim. Olhe para mim, mãe. Olhe nos meus olhos. Apenas olhe para mim. Mesmo que seja só por agora...

— Não!

As palavras que saíram da boca da minha mãe foram de rejeição.

— Não... Absolutamente não... Você sabe por quê? É porque eu te odeio.

— Eu sei.

— Não, você não sabe.

A rejeição era implacável, não importava quantas vezes eu tentasse me aproximar. 

— Toda vez que vejo seu rosto, sinto como se estivesse sendo culpada. Toda vez que vejo seu rosto, lembro-me do sangue. Toda vez que vejo você, lembro-me dos meus erros...

Minha mãe cobriu os ouvidos, rejeitando todos os sons do mundo. Era exatamente como eu costumava rejeitar o mundo ao meu redor na sala de aula. 

— Eu nunca deveria ter te tido! Kuon teria sido suficiente! Se fosse só ela, meu mundo teria sido perfeito!

Um silêncio frio tomou conta da sala. O único som era a respiração ofegante da minha mãe, lutando para respirar. 

— É. Acho que eu meio que sabia.

Eu confiei no calor da mão de Narumi para permanecer consciente. Se eu estivesse sozinha, tenho certeza de que tudo já teria ficado escuro a essa altura, mas eu ainda conseguia ficar de pé. Ainda conseguia falar. 

Uma luz vermelha e quente me iluminava, me apoiava, mesmo nessa escuridão. 

— Mesmo assim, eu não queria aceitar. Porque se aceitasse, perderia de verdade meu lugar aqui... Mas não vou mais fugir. Vou aceitar essa realidade.

Exalei, estabilizando minha respiração. 

Um momento de silêncio. 

As palavras que eu estava prestes a dizer pareciam um ritual. Um ritual para aceitar a realidade. 

— Minha mãe me odeia. Minha existência... sempre a magoou.

Apenas uma dolorosa confirmação da realidade.

— É isso mesmo... É isso mesmo! Vou repetir quantas vezes forem necessárias! Toda vez que olho para você, toda vez que vejo esses olhos, sinto como se estivesse sendo acusada! Então desapareça! Saia da minha frente! Saia do meu mundo perfeito!

Desde que ouvi falar da mãe pela Onee-chan, eu sabia que ela diria isso. Não era um sentimento vago em algum lugar no fundo da minha cabeça. Se eu estivesse na posição da mãe, sem Narumi ao meu lado, teria dito a mesma coisa. 

— Sabe, eu continuei esperando. Eu sabia na minha cabeça, mas até chegar aqui, eu esperava que talvez você, Onee-chan, e eu pudéssemos ficar aqui como uma família de verdade.

Eu esperava. Continuei esperando. 

— Mas... é realmente impossível, não é? Não agora.

Não chore. Eu sabia que isso iria acontecer. É por isso que vim aqui hoje para pedir desculpas. Porque, no mínimo, eu queria pedir desculpas por tudo até agora. É por isso que escolhi voltar. 

Sim. Eu escolhi voltar. 

Totalmente ciente de que teria que suportar tanto as feridas quanto a dor. 

— Mesmo assim... realmente não dá? Não posso ficar nesta casa?

Com determinação e resolução

— Sei que é egoísta querer voltar agora depois de ter fugido só porque me sentia desconfortável. Sinto muito. Mas, mesmo assim, neste momento, quero voltar para casa.

Por mais patético que possa parecer, estou aqui com a determinação de resistir. 

— Sempre achei que a família era apenas um incômodo. Achei que seria mais fácil se pudesse simplesmente esquecer tudo. Mas... não consegui esquecer. Não consegui esquecer a Kuon e nem você, mãe. Fiquei pensando nas duas, pairando no fundo do meu coração. A família é realmente um saco, não é?

Conversei sobre isso com Narumi uma vez.

Sim, a família é realmente um incômodo. 

Mesmo com todo o ódio dirigido a mim, não consigo deixar de lado o que está no meu coração. É uma conexão que existe desde o início da minha vida. 

— Não me importo se você me odeia por enquanto. Mesmo assim... algum dia, quero que você goste de mim.

Afinal, eu não me lembro. Não me lembro de ter sido agredido pela minha mãe, mas há tantas outras coisas das quais me lembro. 

Houve momentos em que minha mãe tinha grandes expectativas em relação a mim. Ela segurava minha mão para que eu não me perdesse. Mesmo quando eu fazia birra, ela às vezes cedia e me comprava um brinquedo. Ela nunca se esqueceu do meu aniversário, nem uma única vez. 

Ela me machucou, me fez sofrer, mas não foi só isso. 

Narumi fugiu comigo e, nos lugares para onde fomos, eu experimentei muita felicidade. Ele me ajudou a lembrar da felicidade que eu estava tentando ignorar. 

Percebo que o que minha mãe me deu não foi apenas dor. É por isso. É por isso. É por isso...

— Tudo bem... fique aqui se quiser.

— Mãe!

— Eu vou embora.

Essas foram as últimas palavras que minha mãe me dirigiu. Ela enfiou suas coisas com força em uma bolsa e saiu da sala. Ela estava prestes a sair de casa. 

Era completamente o oposto do dia em que eu fugi de casa. 

— Mãe, por favor... olhe para mim. Olhe para mim.

— ...

Minha mãe não respondeu. Ela não disse nada. Ela não olhou nos meus olhos e saiu de casa. Do início ao fim, ela nunca olhou para o meu rosto. Ela nunca olhou nos meus olhos. 

A porta se fechou. 

Nenhuma palavra saiu. Minhas pernas não se moviam. Minha mão estendida não agarrou nada. 

— Então, é isso. Acabou.

Não funcionou. Eu pensei que, talvez, pudesse acabar como aconteceu com a Onee-chan. 

— Ainda não acabou.

— Narumi...

Narumi, que estava segurando minha mão, agora estava em frente a mim. 

— Não adianta... você viu, não é? mãe... ela fugiu. Ela escolheu fugir desta casa, de mim... Então agora, não sobrou nada...

— Nós também fugimos, não foi?

— Você está dizendo que isso é o que acontece quando nossas ações nos alcançam?

— Não. Porque fugimos, nos tornamos amigos e depois nos tornamos um casal. Kazemiya, você conseguiu decidir enfrentar sua família porque fugiu primeiro, certo? Sempre há algo no final da fuga.

— Ah...

— Talvez não tenha funcionado desta vez. Talvez tenha acabado por enquanto. Talvez sua mãe tenha fugido de você, mas mesmo ela pode encontrar algo depois de fugir, assim como nós encontramos.

É verdade. Eu tinha fugido. 

— Eu fugi da minha família. Mas depois de fugir, me tornei amiga sua. Agora, posso passar o tempo assim, assistindo filmes depois da escola, me divertindo, comendo em restaurantes familiares enquanto desabafamos sobre as coisas... É tão confortável. 

— Isso é uma coisa boa? 

— É bom para mim. Somos namorados há apenas alguns dias, mas... Eu realmente gosto de passar tempo com você no restaurante familiar, Kazemiya. 

Eu fugi e conheci Narumi. Encontrei alguém importante para mim. Me apaixonei. 

— Estou feliz por ter fugido. E você, Kazemiya? 

— Eu também. Sinto o mesmo. 

É isso mesmo. Foi assim que aconteceu. 

— Fugir não é o fim para nós. O “algum dia” que você esperava não desapareceu completamente.

— Sim.

— Então corra, Kazemiya. Enquanto ainda tem tempo, vá dizer o que quer dizer.

— Sim!

É estranho. Meu corpo inteiro está cheio de calor. Sinto uma energia surgindo dentro de mim para correr. Uma energia vermelha brilhante e profunda está me preenchendo por dentro. 

— Mãe!

Narumi e eu corremos para fora e eu chamei pela figura que se afastava. 

— Estarei esperando! Nesta casa, sempre... Estarei esperando você voltar, mãe!

Não houve resposta. Ela não se virou,  mas, por um momento, suas costas pararam e então ela continuou se afastando. 

Eu a observei até que ela desaparecesse completamente de vista. 

— Narumi. Obrigada.

— Você é quem fez todo o trabalho duro, Kazemiya. Eu só estava observando.

— Você é tão mentiroso, Narumi...

Você me apoiou. Você me deu força para ir atrás dela. Se Narumi não estivesse lá, eu teria desistido de tudo. 

— Você é uma mentiroso, mas... essas palavras não foram uma mentira, certo?

— Quais palavras?

— “Se alguma coisa acontecer, é só me dizer”... essas palavras.

— Elas não foram uma mentira.

Graças a Deus. Eu não achava que fossem, mas mesmo assim… porque agora, eu realmente... 

— Posso chorar nos braços do meu namorado?

Em vez de responder, Narumi me abraçou em silêncio e nos braços do meu namorado, eu finalmente me soltei, derramando todas as lágrimas e soluços que eu estava segurando.



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